A aposta na simplicidade pode fazer com que um filme aparentemente tão singelo e comum alcance o coração de seu público. Lady Bird: A Hora de Voar parte dessa premissa, com uma direção que capta os caprichos e excessos do fim da adolescência, ganhando o seu lugar na prateleira dos bons filmes coming-of-age.

No filme, a jovem Christine “Lady Bird” (Saoirse Ronan) se muda para a cidade de Sacramento, no estado da Carolina do Norte, nos Estados Unidos, e lá vive durante um ano. Amigos, amores e aventuras fazem parte de sua jornada em sua nova cidade. A adolescente e sua mãe (Laurie Metcalf) vivem momentos turbulentos, principalmente depois que o pai (Tracy Letts) perde o emprego.
A diretora Greta Gerwig coloca um tom intimista e real no filme, fruto de sua própria experiência pessoal. O drama comum de muitos adolescentes (na essência pois há aqui uma realidade tipicamente americana) é retratado com a honestidade de quem também morou na cidade em que o longa se passa, além de mostrar uma estudante em um colégio católico. Mas o grande trunfo de Gerwig, que assina o roteiro do longa, reside em colocar no centro das atenções a relação entre mãe e filha. Mágoas, carinho, companheirismo e diálogos próximos da realidade tornam a realidade proposta pela diretora algo extremamente palpável.
Mas afinal de contas, o que esse filme tem demais? Nada, ouso dizer. Da mesma forma, este é o charme do longa, que não se preocupa em ser mais do que é. Na arte, muitas vezes, menos é mais. Gerwig sabe disso, com a naturalidade quem bebe na fonte do cinema indie, e coloca na tela o exagero de uma época em que tudo parece ter uma dimensão maior do que possui. Repare por exemplo em quantas coisas acontecem durante o filme em tão pouco tempo. Um ano é o tempo suficiente para que Lady Bird se interesse por coisas diferentes, possua gostos variados e viva amores e amizades com uma profunda intensidade. Por ser tão ordinário, o drama de uma adolescente que deseja voar com as próprias asas soa como comum. Mas a simplicidade de Lady Bird é genuinamente única e paradoxalmente universal.
A protagonista Saoirse Ronan mostra ser um dos grandes talentos de sua geração. Aos 23 anos e já tendo em seu currículo três indicações ao Oscar, a jovem atriz consegue dar vida com bastante competência a uma personagem que começa chata e irritante. Sim, é verdade. E quem não é assim aos 17, ou pelo menos não gostaria muito dessa versão de si mesmo nessa época? Porém, a personagem vai conquistando o coração do público ao longo do filme, fruto de seu amadurecimento por causa de relação complicada que possui com a mãe e os amigos que a cercam.

Laurie Metcalf interpreta uma enfermeira que ama profundamente a filha, mas se preocupa demais com as frustrações que a chegada da vida adulta podem trazer para a jovem. Esta mulher decidida e disposta a fazer sacrifícios pela menina também possui os seus defeitos e o que o filme tem de melhor é o fato de que, ambas, mãe e filha, possuem muito mais em comum do que imaginam. Inclusive a parte ruim. Nessa rima é que a conexão fica ainda mais forte entre elas.
O elenco de apoio funciona no maior significado da palavra. Lucas Hedges, Timothée Chalamet, Beanie Feldstein e Odeya Rush auxiliam à narrativa no sentido de dar substância ao desenvolvimento da protagonistas. São arquétipos clássicos que já vimos tantas vezes e não há grande originalidade em ver um garoto bonitinho e outro esquisitão, além da melhor amiga tímida e a patricinha descolada. Mas o que é isso senão um espelho da nossa juventude?
Turbulento como a fase que pretende mostrar e com a autenticidade conferida pela sua realizadora, Lady Bird: A Hora de Voar é capaz de cativar através de sua simplicidade. Lady Bird também é um importante olhar feminino sobre relações familiares e amorosas e uma importante obra que sim (!), celebra a capacidade de uma mulher poder contar uma história genuinamente autoral, sobre duas mulheres que nutrem esse amor tão complicado entre mãe e filha.