Em meio ao cenário político atual do Brasil, obras que relembrem a tragédia que o país viveu durante obscuros 21 anos – e principalmente, seus antecedentes – são consideradas cada vez mais primordiais. Mediante ao processo de 9 anos de produção, Legalidade parece ter sido concluído no momento certo, mas, tristemente, não atinge o potencial que tinha capacidade.
Quando Jânio Quadros renuncia o cargo presidencial em agosto de 1961, a democracia brasileira se apresenta cada vez mais fragilizada; é neste momento que o exército brasileiro, com intermédio de investigações norte-americanas, se aproveita da instabilidade política para impedir que o vice-presidente João Goulart tome posse e assim, aplique o golpe militar.
Enquanto isso, por meio de um transmissor de rádio em um bunker improvisado no subsolo do Palácio Piratini, o governador do Rio Grande do Sul Leonel Brizola cria a Campanha da Legalidade – movimento para incentivar o povo ir às ruas garantir a democracia e o direito de Goulart à presidência –, responsável por retardar o golpe que aconteceu 3 anos depois.
Líder de grande atuação política até sua morte em 2004 e um dos principais opositores da ditadura de 1964, Brizola também fundou e presidiu o Partido Democrático Trabalhista (PDT) e por uma diferença de 0,6% em relação ao Lula não disputou o segundo turno da corrida eleitoral de 1989 com Fernando Collor.


Lamentavelmente, Legalidade não faz jus a esse grande nome da política brasileira e muito menos ao movimento que toma o título. Na verdade, o período abordado serve apenas como pano de fundo para passar o foco ao triângulo amoroso fictício entre Cecília (Cleo) e os irmãos Luís Carlos (Fernando Alves Pinto) e Tonho (José Henrique Ligabue), que acaba por tomar conta da maior parte da projeção em cenas dispensáveis dignas de novela. A decisão de Zeca Britto e Léo Garcia em tornar o filme mais interessante para o grande público, no entanto, acaba por adquirir o efeito contrário.
O filme também conta com a subtrama da filha de Cecília (interpretada por Letícia Sabatella), anos depois, em 2004, investigando o passado da mãe que mais tarde é revelada como uma agente da CIA – disfarçada de jornalista, repassava informações do palácio para os Estados Unidos enquanto manipulava os dois irmãos. Diante do objetivo do diretor a ideia poderia ser proveitosa, se não fosse tão mal articulada.
Aparentemente insuficientes, as três histórias simultâneas são conectadas por uma montagem desajustada e por vezes confusa, quebrando totalmente o ritmo do filme e o tornando cansativo. As imagens reais do movimento da Legalidade adicionadas para compor as marchas reproduzidas do filme perdem sua efetividade em meio às inúmeras dramaticidades malconduzidas e cenas que não adicionam nada em sua totalidade.
Apesar dos erros citados e do um tom teatral que a obra por vezes adquire, o filme possui (poucos) bons momentos; esses sendo os que envolvem Brizola. Se o filme se limitasse a contar sua trajetória ou explorar o período antecedente ao golpe de 64 com as imagens documentais do movimento, poderia ter um impacto poderoso. Ao invés disso, se apoia em diálogos ruins e situações improváveis ou nulas, que afastam o filme da realidade.


Legalidade é uma tentativa de Zeca Brito de encaixar a ficção em uma história significativa e de extrema necessidade no período atual, mas acaba por a desviar totalmente. Os casais fictícios são protagonistas na história, sem deixar tempo algum para que o espectador sinta o peso das ações reais antecedentes ao golpe tomadas pelos generais do exército, manipulados para atender aos interesses dos Estados Unidos e dos quais sofremos consequências até hoje.
LEGALIDADE
RESUMO:
Com uma história real e impactante em mãos, Legalidade aposta na ficção novelesca para contar sobre um dos períodos mais importantes da história brasileira.
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